CONTAR UM CONTO
Quem conta um conto não aumenta um ponto. Aumenta muitos pontos. Existe um ponto que inicia um período e outro que respira em busca de inspiração. Existe ponto que se transforma em vírgula e outros pontos em pontos e vírgulas. Existem pontos que se triplicam, deixando o leitor em suspense, paralisado... Existe ponto rebelde e ponto subserviente. Existe ponto fraco e ponto forte. Existe ponto que traz alegria e ponto que traz tristeza.
Quem conta um conto...
Queria contar um conto que contasse aquilo que nenhum conto já contou. Para assim, talvez, o conto se transformasse num inédito conto. Mas tudo que se conta, parece já ter sido contado. Contar um conto é a coisa mais besta e mais honrada do mundo. O problema é que o mundo tá cheio de contos em todos os cantos; há uma epidemia de contos. Contos na sala, no quarto, na cozinha, na escola, na igreja, no trabalho; contos em todos os cantos. Tantos contos que existem nos cantos, que não mais existem cantos para o nascimento dos contos.
Como nasce um conto? Certamente da inspiração do contista. Ele pensa num velhinho cego e um conto já quer nascer; pensa numa senhora gorda e outro conto que vir ao mundo; pensa num jogo de futebol, e mais um conto reclama para ser escrito.
Mas há contos exigentes, contos cabeças-duras, contos que não querem semelhanças com outros contos. Querem ineditismo. É complicada a situação desses contos porque a vida é uma sucessão de contos semelhantes. Onde buscar a inspiração para um conto sem precedentes na história?
Ora, quem descobrir, fica célebre.
Por enquanto, vamos contando esses contos regados a pontos em tantos cantos dos nossos contos. Quem sabe um dia ganharemos com isso com algum conto.
Erisvaldo Vieira
Fevereiro de 2005.
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