Uma Santa Devoção
Em um sítio no sertão,
se viu um fato de fé,
um homem pobre ergueu,
uma igreja e deixou-a em pé,
rezando à Nossa Senhora,
para esse eu tiro o boné.
Vê! Tudo começou em Luiz,
um pobre negociante,
que caiu doente em Minas,
seu mal não tinha calmante,
pois não tinha crença em Deus,
o coitado viajante.
Ele ficou tuberculoso,
uma doença sem solução,
ficou desenganado,
então pediu perdão,
a toda sua parentela,
e encomendou o caixão.
Alguém lhe disse: ˗ Luiz,
deixe disso peça perdão,
se apegue a Nossa Mãe.
˗ Ajas como bom cristão,
peça auxílio por piedade,
tu não ficarás na mão.
Luiz fez uma promessa,
a Nossa Senhora das Graças,
prometeu fazer capela,
pra grande Mãe das Massas,
se por sua intercessão,
ficasse livre das desgraças.
Os pedidos à Mãe de Deus,
foram fortes com efeito,
e Luiz ficou curado.
Resolveu meter o peito,
tinha u’a promessa a pagar,
esmolou, mas deu um jeito.
Luiz nasceu na Matinha,
lá p’ras bandas de Alagoas,
hoje chamam Água Branca,
terra de boas pessoas.
Filho de Olímpia e Neco,
veio da raça das leoas.
Olímpia foi corajosa,
deu treze filhos ao mundo,
entre eles Luiz “de Neco”,
a quem deu amor profundo.
Luiz Feitoza, o seu nome,
guri de saber fecundo.
Foi Luiz “de Neco” o nome,
que o povo lhe escolheu,
e foi assim conhecido,
por branco, preto e judeu.
Dizia ser analfabeto,
o que estudou esqueceu.
Para ele não foi problema,
pois ninguém o passou a perna,
rodou mundo, negociou,
sem ofender a luz eterna.
Lavrou a terra e extraiu,
o pão co’a ajuda materna.
Certo dia a passear,
nas terras da redondeza,
viu uma jovem a andar;
uma flor da natureza.
Depressa pediu seu nome,
ela disse: – É Tereza.
O atrevido se adiantou,
apeou e foi conversando,
não demorou e estavam,
os dois namorando.
Luiz e Teresa se gostaram,
terminaram se casando.
O casal frutificou
e, chegou a bela Maria,
depois Maria das Dores,
a Gedalva e a Julieta,
a Dulcineia e o Geraldo,
das Graças e então José.
Com uma família tão grande,
tantas bocas pra alimentar,
o jeito foi ir pra São Paulo,
buscar trabalho e ganhar,
por lá um bom dinheiro e,
sonhando partiu do lar.
Em São Paulo foi o bicho,
Luiz era analfabeto,
foi trabalhar de vigia,
pelo menos teve um teto.
Ganhou dinheiro e pensou,
em partir pr’outro trajeto.
Com seu jeito inquieto,
decidiu voltar pro Norte.
Mas, antes foi para Minas,
tentar mais uma vez a sorte,
e visitar sua querida mãe,
suas irmãs, mostrar-se forte.
Seguiu pra Belo Horizonte,
sua mãe ali já residia,
pensou em empregar-se,
trabalhar no que sabia.
Mas, a sorte foi madrasta,
trabalho não aparecia
Luiz se viu desgraçado,
sem trabalho e sem valia,
rogou praga, blasfemou,
a mãe rezava, ele gemia.
Tinha pego tuberculose,
ia morrer, pressentia.
Quando disseram reze,
ele se converteu e rogou:
– Mãe das Graças me ajude,
se eu ficar curado –, rezou:
– Vos construirei uma capela.
A Mãe pediu, Jesus curou.
Luiz comprou uma imagem,
grande, bonita por sinal.
Então disse: – Aqui começa!
Pôs os trecos no embornal,
se arrumou, disse pra si:
– Só paro agora no final.
Despediu-se de sua mãe,
e saiu em peregrinação.
Ia de porta em porta,
pedia ajuda a cada irmão,
e foi juntando o dinheiro,
de cumprir a obrigação.
Quando chegou a Alagoas,
já sabia seu destino,
foi ao Pariconha,
buscar o genro Agripino.
Foram ao padre Epifânio,
que pensava pequenino.
Disse então Padre Epifânio:
– É melhor dar o dinheiro,
pra igreja do Pariconha!
E Luiz: – O meu romeiro!?
– Não! O que ele vai dizer?
– Nunca! Não sou flibusteiro!
Como o padre proibiu,
e ainda amaldiçoando,
foi Luiz até à Pedra,
falar com Padre Fernando.
Disse ele: – Vá ao bispo! É a saída!
– Fale baixo e vá domando.
Mas o bispo era arisco,
não quis se comprometer.
Disse: – Entendo a situação,
mas não posso nada fazer.
– Procure outro estado,
outro padre vai querer.
Tacaratu, por que não?
Luiz sabia da festa,
e da Santa a devoção.
O padre franziu a testa:
– Infelizmente não pode!
– Tente o frade de Floresta.
Cansado de ouvir não,
Luiz foi a Pesqueira.
O bispo prestou atenção,
por fim disse: – Quanta asneira!
– Se não pode na cidade,
busque outra parceira.
– Eu dou autorização,
pra fazer na zona rural.
Procure um bom sítio,
diga que dei o aval,
Pegou papel e escreveu,
assinou, botou o sinal.
Mas onde fazer a capela!?
Pensa aqui, pensa de lá,
por fim veio a solução.
Pensou: – Na Laginha dá.
Eu conheço seu Bento.
É um café com fubá.
Luiz falou com seu Bento,
tomaram um bom café,
disse Bento: – Vou ajudar!
Luiz viu um homem de fé.
– Aqui tem um bom terreno,
pra vender, é um filé.
– Vou te levar ao dono,
lá você fala com ele.
Disse o seu Bento a seu Luiz:
– Vais gostar da terra dele,
e a capela de Maria,
construirás ali, nele.
O dono era seu Clarindo,
um cunhado de seu Bento.
Foram lá e conversaram,
um terreno bom de vento,
estava para vender,
o negócio tomou alento.
Nisso chegou Antônio,
um filho de seu Bento.
Disse: Tá vendendo tio?
Eu também quero assento,
tenho casa aqui em frente,
pra terra tenho intento.
Ao ouvir de Luiz a história,
disse: Santa devoção!
– Eu não quero mais comprar,
e já vos peço perdão.
– Vamos fazer a capela,
pois eu também sou cristão.
Passaram então ao preço,
o dono queria um valor,
Luiz achou muito caro,
Teve um surto de pavor.
Fez uma contraproposta:
– É o que eu posso propor!
Seu Clarindo achou pouco,
ficou aquilo remoendo,
vender era o que queria,
e o preço “miserendo”,
mas, o que fazer então,
seu Luiz “tava” sofrendo ...
Pensou, pensou e nada,
pôs-se então a conversar,
Antônio foi papeando,
Bento entrou pra ajudar,
o homem foi pensando,
concordou em mudar.
Mudando a decisão,
disse então: – Vou vender!
– Se é pra Nossa Senhora,
não há o que fazer.
– Vamos tomar um café,
e o desacordo esquecer.
O acordo foi selado.
Agora de posse da terra,
um pedreiro chamou.
Luiz ao lado da serra,
a construção começou.
E ufa! Acabou uma “guerra”.
A construção andando,
seu Luiz mais animado,
foi buscar a família,
pra viver ao seu lado.
Uma nova vida pra todos,
juntou azul e encarnado.
Terminada a capela,
foi aquele festão.
Teve até novena e fogos,
rezaram muita oração,
Naquele momento todos,
pediram a Deus o perdão.
Tereza e Luiz partiram,
estão com Nossa Senhora,
os seus herdeiros zelam,
e a capela revigora.
Se juntaram c'os Major,
um povo que a Deus adora.
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